quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

O cd VIELAS LÍRICAS
















O BAILE DAS LÁGRIMAS (Faixa 07)



Patrocinado pela Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, através da Lei Municipal de Incentivo à Cultura, o CD "VIELAS LÍRICAS” é uma narrativa cantada, à moda do cantador Seu Ribeiro, que ele começou a tecer em meados de 1992, inspirado pela história do peão Zé Horta e que só agora deu cabo, com o objetivo de celebrar a marca de dez anos de carreira, dedicados ao ofício da cantoria de cabeceira (estilo musical do sertão, da roça).

A história cantada, narra à desventura de um vaqueiro do Norte de Minas que decidiu se aventurar em um rodeio, que teria ocorrido pelas bandas do Triângulo Mineiro, deixando a noiva com promessa de breve regresso e juras de amor.

O disco viabilizou a participação de inúmeros cantores e instrumentistas, Mãe Helena, Adelaine Ribeiro, Xangai, Chico Lobo, Johnny Hermo, Márcio Britto, Tony Ribas, Mestre Linguinha, Babilak Bah, Djalma Januário, Black Pio, Tom Nascimento, Coroné, Eric Duart, Andreia Ribeiro, Anderson Algusto, Guiu Medeiros, Maurício Duarte, Gibram Muller, Demonsthenes Junior e Suely Silva, além da participação especial de Betinho Macedo, ex-baixista da “Banda A Cor do Som”.

Gravado no Estúdio Abre Alas, em Santa Luzia, com mixagem de Dalton Palmieri e maxterizado na Master Disc, o cd recebeu uma atenção especial em relação ao seu encarte, com Ilustração do artista plástico Wilton Vinicius e fotografias do amigo e músico Juca Filho, ex-Boca Livre, e retratos de Seu Ribeiro feitos pela sua própria filha, Cecília Ribeiro, de oito anos!

terça-feira, 30 de novembro de 2010

O cantador SEU RIBEIRO

Tendo iniciado sua carreira em 1999, quando foi convidado para participar de um evento no centro cultural Lagoa do Nado, Seu Ribeiro passou a ser considerado pela crítica mineira uma das grandes revelações da música regional contemporânea. Tal reconhecimento foi confirmado pela crescente acolhida do público, e levou-o a ser convidado para entrevistas em programas de TV como Globo Horizonte (REDE GLOBO), Sr Brasil (TV CULTURA), Arrumação (REDE MINAS), Viola Brasil (TV HORIZONTE) etc.

Seu Ribeiro em sua cidade, Santa Luzia-MG:

Em 2002, já se destacando no cenário musical, recebeu honrosa benção do padrinho e cantador Elomar Figueira Mello, e se apresentou com ele em BH e pelo Brasil afora. Desde então, com a carreira de músico consolidada, participou de inúmeros festivais e eventos por todo o Brasil, dentre eles o II Encontro Nacional de Violeiros em Ribeirão Preto/SP (2004) e o II FESTIVELHAS, realizado em Jequitibá/MG (2008).

Mineiro de Belo Horizonte, Seu Ribeiro descende de uma família de músicos. Sua trajetória é marcada pela generosidade daqueles que fazem da arte de cantar mais que um simples meio de vida: ela é, sobretudo, um estandarte em defesa dos valores e princípios inerentes à identidade cultural do povo brasileiro.

Neto de congadeiros, Seu Ribeiro herdou o legado da folia de terreiro e, também, o tino natural dos Poetas Estradeiros que decantam a Sabedoria Popular, buscando fragmentos da memória ancestral registrada na oralidade de seu povo. É com essa consciência, que esse menestrel mineiro vem se doando ao Ministério da Cantoria de Cabeceira, onde decanta as coisas de seu viver, tributando, em cada verso, a tradição e devoção do caboclo sobre a terra.

O conteúdo litérário do cd VIELAS LÍRICAS

Nas folhas brancas da vida
Escrevemos nossa história;
Uma crônica vivida
Em um épico de glória!


Até meados dos anos oitenta, a população do recém formado bairro Jaqueline, a meia légua da Mata da Mariquinha em Belo Horizonte, limitava-se a algumas famílias nativas e outras vindas de esparsos rincões sertanejos, isoladas por antigas fazendas que se estendiam sobre as periféricas montanhas de Belo Horizonte, na divisa com Santa Luzia. Sob essa circunstância, mesmo morando numa capital de arraigada tradição modernista, levávamos uma vida típica do interior de Minas Gerais.

Recordo-me que era véspera de rodeio na região e Zé Horta, um forasteiro que auxiliou na lida com o gado miúdo do curral de Seu Cândido, numa tarde, já no fim da labuta, narrou a desventura de um vaqueiro do Norte de Minas que decidiu concorrer em um rodeio distante de sua cidade - abandonando sua noiva com promessa de breve regresso e juras de amor.

Anos mais tarde, quando decidi musicar a história que ouvi de Zé Horta, ele já havia nos deixado, e eu não fazia idéia da complexidade de tal empreitada, pois, não imaginava o quanto me exigiria concebê-la em sua plenitude, tendo que recorrer apenas aos porões relapsos de minha memória, por isso, deixei-me levar pela imaginação a fim de alcançar sua inteireza, tomando todo cuidado para que a ficção se manifestasse sem prejuízo da integridade da história que ouvi.

Gostaria de ressaltar que, Inescrupulosamente, lancei mão de toda e qualquer possibilidade linguística disponível ao meu alcance, reservando-me, a cada movimento, o direito a devaneios e subjetivações, e pelo mesmo princípio foi regida a multidão de compassos que arrebanhei, ignorante de espaços e eras, esbarrando apenas pelas estacas convincentes da minha autocrítica e satisfação.

Portanto, VIELAS LÍRICAS consiste numa narrativa cantada, a minha moda, que comecei a tecer em meados de 1992 e que só agora dei cabo, com o objetivo de celebrar a marca dos dez anos dedicados ao ofício da cantoria de cabeceira.

Seu Ribeiro

1ª) Destaramelando a porteira



Narrador: Meu povo dê permissão preu contar uma história de amor; a que apurei cuns peão no currá quando Zé Horta narrou! Inda eu era um menininho quando o relato se deu; Tico saiu de fininho, quem cuieu tudo fui eu e no dia da vaquejada eu vi a água que o boi bebeu!

Era noite escura quando o vaqueiro apeou, dizendo: “- Amor, já vou-me embora com as forças que Deus deixou! Que ontem eu vi um novaseita pregando, na tapera de Chico Leviano, que as sete vacas gordas pastando já-já arribam pros lados de cá! E nesse pé entra ano e sai ano e nos ficamo a esperá. Promessas, mentiras, que nunca ninguém viu rastro de que cumpriu”.

Noiva: Muitos homens erraram o caminho, muitas pedras se encontraram sim; muitos foram os desenganos, poucos foram se acertando, mas de tudo o que é pior é viver a só, inda que esperando. Faz dó viver sem teu calor; faz dó entardecer antes do sol se por; faz dó passar a vida a esperar um grande amor. Me leva, amor, que eu vou.

Vaqueiro: Bem, eu vou partir que a hora é essa e eu já não posso mais ficar. Vim me despedir; amor não chore, não sei quando vou voltar.

Êêêêêêêêêê boi,vou aboiar
Êêêêêêêêêê boi,vou aboiar
Boi Digira, eu vou girar

Bem, antes do sol nascer quis ouvir a tua voz! Que Deus do céu cuide da terra e não se esqueça de nós; que jurei pelo seu nome e essa jura me consome! Se eu morrer um dia inhantes, peço a ressurreição; pra cumprir minha missão, me dê só mais um instante.

Ê boi, vou aboiar
Ê boi, Ê boi, Ê boi
Ê boi, vou aboiar
Ê boi, Ê boi, Ê boi


...
Vozes: Seu Ribeiro (narrador), Adelaine Ribeiro (noiva do vaqueiro), Xangai (vaqueiro).
Instrumentos: Violões (Seu Ribeiro e Márcio Britto), Violoncelo (Demonsyhenes Júnior), Flauta (Guiu Medeiros), Percussão (Johnny Herno), Berrante (Maurício Duarte de Paula).




Foto de JotaerreIlustração de Seu Ribeiro
Obs: Todas as ilustrações feito a lapis que ilustram este blog, são desenhos pessoais feitos por Seu Ribeiro

2ª) A paisagem livre por desentrança




Zé horta: Vendo o gado minguado no pasto e a ossada cobrindo o sertão, um vaqueiro pro Triângulo Mineiro saiu galopando o alazão! Foi tentar a sorte num rodeio com anseio de ser campeão e deixou sua noiva chorando, prostrada lá no portão. João, se ouvisse o caso da parteira que vive a vida a murmurar, te juro, tu mão sairia, não arredaria o pé do seu lugar!

Narrador: Dália, mãe do riso e da alegria, nasceu numa noite sombria quando a lua se escondeu de vergonha da donzela, de tão bela que nasceu! Se criou nos campos da pureza e no Rio das Gotas adoentou de amores! De todos vaqueiros de lá, pai, nenhum foi mais feliz que João, uai, que derna os tempos de criança volvia suas tranças pelos cafezais! Mas tanto tempo faz, que amor pesou no coração! A saudade é uma estaca Junto a cerca da desilusão! Quem tem amor de lonjura, sofre perto a ingratidão; onde a lágrima perdura, um riacho de amargura banha a face do cristão. Que eu perdi meu paradeiro, no pé de um sonhador; percorri o mundo inteiro amor, não encontrei meu parador!
...

Vozes: Black Pio (Zé Horta); Seu Ribeiro (narrador).
Instrumentos: Violão (Seu Ribeiro), Acordeon (Coroné), Percussão (Johnny Herno), Caixa de Folia (Gibram Muller), Pandeiro ( Linguinha).

3ª) O canto bélico dos feirantes



Narrador: - Mas cadê meu companheiro, cadê o companheiro meu, grande amigo que um dia cantava mais eu?” Era o que a moça cantava velando o estradar, sonhando com o dia de João voltar. E o tempo se arrastava devagar e a linda Dália a esperar o amor que jurou voltar e não voltou, deixando sua alma inflamada de amor. O tempo se arrastava devagar e os boatos não paravam de chegar: “-João, não volta mais não! Vai vê que esqueceu. Será que morreu?! Quem sabe na cara do boi João tremeu?! Mas por onde ela ia fazia saber que esperaria o noivo até ela morrer. E aconteceu que num dia de feira ela se encantou com os galanteios de um forasteiro que lá chegou:

Forasteiro: Índio feito de madeira não tem coração pra amar! É feito castelos de areia que ninguém pode sondar. Deixe o índio na aldeia, feito criança no mar, feito o sol e lua cheia a girar e encantar; e vem ver a beleza oculta da aldeia da tribo mais bruta. Pro bem das filhas de Iracema, aprenda a enxergar com os olhos do amor.

Narrador: Uma estátua de um pataxó foi a causa maior para a aproximação...

Feirante: ...que feriu João, que feriu Zé, que matou de amor Tião Macalé, que abaixou a bola de Zico e Pelé e deixou na fossa o amigo Migué. Dália, mãe das alegrias dos mancebos do meu sertão, musa de pancadaria, laços de perdição. Que feriu João, que feriu Zé, que matou de amor Tião Macalé, que abaixou a bola de Zico e Pelé e deixou na fossa o amigo Migué. Lá na ribeira, bem na cabeceira, tem um pé de amoreira que é da gente namorar; meus olhos choram até parece cachoeira só de lembrar da romeira que hoje já não mora lá! Foi embora pra repuxo, ai, ai; pra viver vida de luxo, uai! Foi embora pra são Paulo, ai, ai; pra viver vida de Saulo, uai!
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Vozes: Seu Ribeiro ( Narrador), Eric Duarte (o farasteiro Léo Prosa), Tony Ribas (um feirante).
Instrumentos: Violões ( Seu Ribeiro e Márcio Britto), Bandolim (Anderson Augusto), percussão (Johnny Herno).

4ª) Nas candongas do entardecer

Narrador: Dália arrematou na feira o índio de madeira sem ter precisão e voltando para casa com o peito em brasa esquecera de João! Deus do céu seja valido, será que o cupido fez arrumação?! Mais belo que o abrir das rosas, ressonou Léo Prosa no seu coração.

Noiva: Sonhos que eu não canso de sonhar, amores que eu não deixo de amar, velhos retratos na memória que eu teimo em guardar. Avoa canarinho e leve seu ninho pro lado de lá, que eu fico na cidade cantando a saudade no mesmo lugar. Vai riscar o ponteado que do meu lado aprendeu solar, no cair das tardinhas na porteirinha do velho currá! Vai com toda a pena que de Mantena no meu peito veio pesar, que a felicidade é fruto de cultivar! Mas quem não quer colher espinhos, tire as pedras do caminho, deixa solto o passarinho, a voar! Que a minha felicidade, a sua felicidade, a nossa felicidade é fruto de cultivar.
...
Vozes: Seu Ribeiro (narrador), Adelaine Ribeiro (noiva do vaqueiro) e Andreia Ribeiro (irmã da noiva).
Instrumentos: Violão (Seu Ribeiro), Viola (Chico Lobo), Percussão (Johnny Herno)

5ª) Toada dos desenganos

Narrador: A diaba num sabia pra que lado decidir, se ia embora pra repuxo, pra viver vida de luxo, ou se ficava ali. Se enfeitou e foi pra missa, pra rezar e pra pedir, e nos degraus da capela o Passo Preto, cantador tagarela, riscou alto pra ela ouvir:

Cantador:
Mulher de cego que se enfeita não se endireita daqui pra li, não é pra fazer desfeita mas só enjeita a quem num sabe pedir! Hora vá, muntemo o mundengo e deixemos de dengo pra mode nos ir, pois é na cara do gado que se aprende a decidir! Depois do apuro passado a gente lembra e até ri, mas na hora do sufoco é salvador daqui pra li! Ôh Dália, me dê ouvido, ouvido dê atenção é que eu assuntei na feira, menina, uns boatos de João!

Forasteiro: Contam que em noites de lua cheia a lavadeira encantada (ai, ai, ai), desce só pelas escadas e segue calada até a boca do rio. Como quem cumpre a obrigação de lavar as águas do rio (quem sujou?), mas depois desaparece, tal qual fosse a prece que o vento soprou. Um dia desse um pescador banhava nas água do rio (quem mandou?!), cabô topando a donzela, se encantou por ela e nunca mais voltou. Uns contam que ele se afogou, outros que ele se mandou, outros não, e ainda hoje uma esperança no peito não cansa de esperar João.

Narrador: E sola o coro da igreja: “Deus proteja os filhos teus que sai a penar no mundo cheio de tribulação ir parar na cochichina resistindo a tentação se valendo só da fé que pouca é, menor que um grão”.

Forasteiro: Manhã haverá de passar, a fera mais bela de olhar (ai, ai, ai), com os cabelos cacheados e um balaio do lado pra me enfeitiçar. Na boca um canto de sereia, nos olhos umfogo abrasador (me queimou!); nessa noite de lua cheia sou fruto da aldeia no balaio do amor.

Noiva: São seis horas, Ave Maria deixou o rio com saudades da paz, dos tempos em que as delícias, corpos crus nus de cristais, no pé de um valsador bailava nos gerais com amor e nada mais!

Cantador: Menino da Boca do Rio, mas o que é que ocê quer?

Forasteiro: As curvas do Rio das Gotas feito curvas de mulher, pra que a menina navegue no desaguar dos meus zói; feito espelho cristalino são os lençóis dos zói do menino.

Cantador: Menina da boca do rio, e ocê, o que é cocê quer?

Noiva: A curva do Rio das Gotas tale como ela é: Clara, límpida, serena, graciosa em sua função e que lave com alegria as penas do meu coração.

Cantador: Houve um grande ajuntamento no No caldeirão dos apuros, pra onde foram convocados os vaqueiro mais taludos pra laçar o Boi Digira só com a mira das mãos, onde o vencedor seria o Rei do Laço do sertão.

Galalau do Mangue Seco quebrou a estaca nos peito numa arrancada de prancha de uma pegada sem jeito; Chico Venâncio, de Quedas, caiu parando côas mão o sangue véio das veia numa quarta de lua cheia, topando com a véa feia nesta festa de pião. E contam que esse entremeio durou sete dias sem trégua e sem freio. Deixando o currali vermeio com as poças de sangue dos homens mais véios dessas festanças de rodeio.

Deu a sexta badalada deu que João entrou na dança, era tanta esperança nos olhos desse peão! Corre-corre, pega-pega, finca pé, escorregão; Baio Anzol levou a nega, um burro n'água, outro no chão. Foi que o boi furou a cerca, espaiando a multidão; mata Romeu e Julieta distraindo o coração e foge pra mata fechada sendo asseguido de João que cheio de valentia de olho nas honraria topou com o que não queria e feito Saulo foi ao chão. Por resto nem rastro do gado que, na brincadeira, deixou João cegado; e o povo todo amedrontado gritava em coro: “-Olha o touro é encantado!” Indo, cada um pro seu lado.

Me contou um morador antigo da região que nunca mais viu rodeio naquele parmo de chão que se chamou derna então de Cemitério do Pião.
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Vozes: Seu Ribeiro (narrador), Tom Nescimento (cego cantador), Eric Duarte (forasteiro), Adelaine Ribeiro (Noiva do Vaqueiro)Andreia Ribeiro (irmã da noiva) Sueli Silva (amiga).
Instrumentos: Violão (Seu Ribeiro), Acordeon (Coroné), Percussão (Johnny Herno), Caixa de Folia (Gibran Muller).

6ª) Caindo na lapa do mundo


Forasteiro: Vamosimbora, sem demora, antes que a luz da aurora possa te esbarrar com essa paisagem serrana que você mucama tanto soube amar; dê adeus e adeus ao abrir das flores, recantos dos teus amores, lance o perfume no ar ou conserve-se até João voltar!

Noiva: Sonhos que sonhei em noites que embalei seu sono, que velei no leito em que eu deitei e paz! Valei-me Santo Deus, Nossa Senhora, deixo tudo e vou-me embora pra plantar noutro lugar! Chora e sangra peito macerado na Estrada do Cafezá!

Ventania deixe os meus cabelos, seque o pranto dos meus olhos afague o meu coração carregado de ilusão; toma meu corpo em sono profundo, enquanto vou pelo mundo! Valei-me Santo Deus, Nossa Senhora, deixo tudo e vou-me embora pra plantar noutro lugar! Chora e sangra peito macerado na Estrada do Cafezá!
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Vozes: Eric Duarte (forasteiro), Adelaina Ribeiro (noiva do vaqueiro), Seu Ribeiro (Narrador).
Instrumentos: Violão (Seu Ribeiro), Acordeon (Coroné), Percussão (Johnny Herno).

7ª) O baile das lágrimas

Narrador: O tempo passa a rastejar com tanta ausência no lugar! Depois que a donzela se foi, sem espaço um vazio se pôs entre os dois corações paternais. Ôh, Maldição! O sol não poupou nem sequer a poeira do chão! Uma carta vencendo as estâncias dos astrais, uma casa ruindo, caindo, afinal é a trombeta dos ais! Maldição! O sol não poupou nem sequer a poeira do chão! Por culpa de uma fantasia inculta de uma alma sombria, etéreo o astro dos astros nefasto se incendiou; enrugando a face augusta do planeta que secou e morreu. Pra cumprir a profecia proferida de um judeu, o olho d'água gracioso que um dia a terra verteu, a língua de fogo do sol já lambeu!

Pai da noiva: Rosalinda, meu bem, quem vem lá? Eu cá já não mais posso enxergar! Diz pra mim que não é o pisar do cavalo Baio Anzol! É que eu cá já num mais tenho, minha velha, costados pra me recostar. Ôh, Dália, porque foste embora? Porque deixaste seu lugar? Seu noivo já ponta lá fora contando as horas, pra te abraçar.

Carta da noiva: Ao lampejo de um beijo meu peito se abriu pra bailar com o desejo a toada servil; me expondo a olhos nus de urubus, carcarás de um amor, de nós, de mim... Alcoviteiro cruel, vil mercador infiel, luar de amargor no céu azedou meu mel, me expondo aos juízos do céu. Chora o peito de um vaqueiro, lavando a alma com a dor; faça chover no terreiro incelenças pra este amor. Falsa jura, dissabor!

Mãe da noiva: Por mil sóis, por Rosas mil, por mais de mil girassóis nos lençóis de abril, o céu de anil me viu chorando, riu! Ai, esses mercadores! Feito venda, vais! Saudade não tem idade para se aposentar; saudade é dor que invade, vem pra ficar!

Pai da noiva: Lucas, apague a candeia, o carteiro vagueia! Errante viajante, tu saia daqui. O que é que há xara? Será que é pouco, moço, o meu desgosto?! Uai, senhor?! Tudo que eu tinha Deus levou, o que eu juntei vento espalhou, e o que podia ser pior, só Jó herdou num dia só.

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Vozes: Seu Ribeiro (narrador), Djalma Januario (pai da noiva), Adelaine Ribeiro (noiva do vaqueiro), Mãe Helena (mãe da noiva).
Instrumentos: Violão (Seu Ribeiro), Flauta (Guiu Medeiros), Violoncelo (Demonsthenes Junior), Percussão (Johnny Herno).

8ª) Atos de João


Narrador: Um tempão durou e João não voltou pra rever o torrão que um dia, em vão, jurou de coração. E Dália das Gotas, donzela, garota, foi junto com as outras serguir a escrota paixão. O caso é que um curandeiro sarou a cegueira de João, que se juntou com um mineiro pra ser garimpeiro em outra região, e não voltar com as mãos vazias de novo a bacia do seu quilarão. “-Simbora João!”

Brigando na goela do vêio, que febre era aquela! No corpo um alumeio, por causa da vela que hora no céu permanece a brilhar! E João toda noite alembrava os beijos da amada querendo voltar: “-Espere amor que eu volto já!” Até que uma pepita daquelas esbarrou em suas mãos. João despediu-se do vêio: “-Inté meus irmãos, não fico aqui mais não! Vou rever meu torrão e descansar o coração ao lado do pancadão que ficou lá, pra lá, mas bem pra lá deste serrão!”

Mas no caminho uma emboscada; piteira, chumbeira, estampido, rojão! João beijou o pó da estrada: “- É fim da picada! Eu, não volto não! Adeus a inculta fantasia, adeus luz do dia, adeus quilarão! Volto é pro chão!”
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Voz: Seu Ribeiro (narrador).
Instrumentos: Violão (Seu Ribeiro), Bandolin (Anderson Augusto), Baixo (Betinho Macedo), Percussão (Johnny Herno), Berimbacia e Berimboca (Babilak Bah).

9ª) Epístola Paulistana

Narrador: Segundo Zé Horta, Rosália Medeiros, a linda Dália do Rio das Gotas Serenas, obrigada ao ofício das meretrizes, desesperou-se da Própria vida portando, ainda, a aliança de seu compromisso com o vaqueiro João!

Noiva: Lá do sertão, do nunca mais, deixei um rio de pó e só promessa e nada mais, junto aos degraus das catedrais de homens banais que pedem a paz fazendo a guerra dos gerais. Lá do sertão, do tanto faz, paguei promessa a rosa indecorosa lançando ao léu prosas banais. Lá do sertão, serei a dor do jamais de um amarelo mar de rosas e cristais. Lá onde a esperança quer ressurreição, lá onde a fé tenta banhar o chão, lá onde se inveja o ancião por ter chegado a ser tão...
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Vozes: Seu Ribeiro (narrador) Adelaine Ribeiro (noiva do vaqueiro).
Instrumentos: Violão (Seu Ribeiro), Violoncelo (Demonsthenes Junior), Percussão (Johnny Herno).

10ª) Odisséia Sertaneja

Narrador: Esta história que eu contei não teve um final feliz! Não foi feliz a donzela, nem quem amou ela, ou quem ela quis! Tanta gente neste mundo vive cega a transitar, sem saber que um poço fundo inside num segundo para nos tragar. A infelicidade invade, apronta e faz de conta que não quer ficar!

Pois depois da curva do rio, donde a boneca pariu, um velho profeta do amor me contou que assistiu quando o estrelo caiu feito uma jaca no rio de pó. Deu dó! Que em riba daquela ponte, muita gente atravessou sem saber que um dia Maria também se afogou, tentando encontrar o seu filho que as águas levou. Deu dó!

Lá no serrão vive o guardião da sempre-viva, que se encantou e sua história virou notícia! E hoje já corre pros trechos alheios adornada com as cores da mentira! Falsos mestres profanaram a memória de um fiel! São cegos guiando cegos que não chegaram ao céu! Com as penas dos filhos de Adão, me resta um alento pra me consolar, que a chama dos justos não se apagará!

Olhando para o céu, miro a imensidão e nada mais vejo pra mudar minha opinião. O que eu vejo é só mentiras derna os Tempos de Adão. Aos donos da terra, que tenho a falar, se a voz da verdade não querem escutar?! Vou caminhar... Mas antes de eu ir embora picando meus versos pela estrada afora, zombarei de seus castelos reduzidos a farelos num amarelo mar de pó que só se vendo... Deu dó!
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Vozes: Seu Ribeiro (narrador).
Instrumentos: Violão (Seu Ribeiro), Acordeon (Coroné),
Percussão (Johnny Herno).

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

UMA PALAVRA

Dedico esta singela obra à primeira infância de um aglomerado que se formou na cabeceira do Córrego dos Toucinheiros a légua e meia da Mata da Mariquinha em Belo Horizonte - os antigos moradores do bairro Jaqueline. Em especial a memória de Sô Tibúrcio, Zé Horta, Sô Porfírio, Seu Amaral e Sô Antônio, velhos encantados que povoaram meu mundo de criança com suas histórias, causos e lendas, me ensinando, muito, a viver e sonhar.

Que seja o reconhecimento de meus entes e amigos estendido aos que, com alegria, obraram comigo nesta produção, especialmente ao Centro de Cultura Lagoa do Nado, à Fundação Municipal de Cultura de Belo Horizonte e ao grande companheiro dos violeiros e embaixador da viola caipira, Chico Lobo, pelo apoio e impulso indispensáveis a esta nossa conquista.

À todos, meu emocionado e sincero muito obrigado!
Seu Ribeiro

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Ficha técnica:
Direção geral (Seu Ribeiro), produção executiva (Seu Ribeiro e Natália Botarro), assistente de produção (Luciana Gonçalves), direção musical e arranjos (Seu Ribeiro), técnico de gravação e mixagem (Dalton Palmieri), gravação (Estúdio Abre Alas), masterização (MASTER DISC), arte e concepção gráfica, (Wilton Vinícios e Marcelo Feitosa), fotos de capa e de rótulo do CD (Juca Filho), foto de Seu Ribeiro (Cecília Ribeiro), ilustração (Wilton Vinícios), revisão e assessoria de imprensa (Marcelo Botelho).

Patrocínio: